Novo recurso do ICMBio sobre cobrança de ingresso causa revolta entre moradores de Jericoacoara
A disputa judicial envolvendo a cobrança de ingressos para acessar a Vila de Jericoacoara terá um novo capítulo no próximo dia 9 de dezembro, a partir das 13h30, quando a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), no Recife, julgará o recurso apresentado pelo ICMBio. O processo, originalmente movido pela Prefeitura de Jijoca de Jericoacoara, envolve ainda a Urbia Cataratas, o próprio ICMBio, o Governo do Estado, o Conselho Comunitário, o Conselho Empresarial, além da participação da Defensoria Pública do Estado e do Ministério Público Federal.
A ação ganhou destaque após uma liminar separar dois temas centrais: a realização de obras pela concessionária, e a cobrança de ingressos para acesso à vila. Em primeira instância, a justiça autorizou as obras, mas limitou a cobrança apenas aos atrativos específicos, impedindo a taxação automática de qualquer pessoa que ingressasse na vila.
Essa decisão desencadeou diversos recursos. No tema das obras, Prefeitura, Ministério Público e Defensoria Pública argumentaram pela ilegalidade das intervenções, mas a Justiça Federal confirmou sua execução – posicionamento mantido de forma unânime pelo TRF5 ao julgar o primeiro recurso, da Defensoria, e depois replicado aos demais.
Já sobre a cobrança na entrada da Vila, a Urbia recorreu. O pedido foi julgado no último dia 21 de outubro, quando o tribunal rejeitou, por 2 votos a 1, o restabelecimento do ingresso de acesso, mantendo válida a liminar que restringe a cobrança apenas aos atrativos.
“Quando o processo caminhava para uma resolução, com jurisprudência clara e entendimento praticamente consolidado, o ICMBio surpreendeu a nossa comunidade e demais atores ao apresentar seu próprio recurso, com o mesmo objetivo da concessionária: reativar a cobrança de ingresso na entrada da Vila, independentemente de o visitante acessar ou não os atrativos do Parque Nacional”, questiona Delphine Estevenet – presidente do Conselho Empresarial da Vila de Jericoacoara.
A atitude gerou indignação e sentimento de traição entre moradores, trabalhadores e instituições. Isso porque, durante as audiências públicas de apresentação do projeto de concessão, o ICMBio, acompanhado pelo BNDES, prometeu expressamente que: a cobrança seria feita apenas nos atrativos, a entrada na Vila continuaria livre, e o direito de ir e vir da comunidade jamais seria afetado.
“Ou seja: a comunidade apoiou o processo de concessão baseada em compromissos públicos do próprio órgão. Agora, ao recorrer para restabelecer a cobrança geral na entrada, o ICMBio contradiz aquilo que disse a toda população quando buscava seu aval para o projeto. É um recado claro de desrespeito”, pondera Lucimar Vasconcelos – presidente do Conselho Comunitário da Vila de Jericoacoara.
O novo recurso é visto por lideranças locais como um gesto de alinhamento do órgão a interesses que não representam o interesse público e nem a realidade social da vila. Para representantes da comunidade, o ICMBio não apenas ignora o entendimento já firmado pelo TRF5 no caso da Urbia, como também rompe com o pacto feito nas audiências públicas.
“A comunidade se sente traída. Quando o ICMBio trouxe o projeto de concessão, junto com o BNDES, ele garantiu à população que a cobrança seria apenas nos atrativos e que a entrada da vila seria livre. A comunidade deu seu aval acreditando nessa palavra. Agora, ao assistir ao julgamento da Urbia e ainda assim insistir em um recurso próprio, o ICMBio envia um recado claro: não respeita a comunidade, não respeita o que foi acordado e não está do lado do interesse público”, afirma Fábio Nobre – presidente da Associação de Windsurfistas de Jericoacoara.
A presidente do Conselho Comunitário reforça que a postura do órgão viola o compromisso assumido durante as audiências públicas. “Se estivesse ao lado da comunidade, o ICMBio não teria apresentado esse recurso, e poderia, inclusive, ter desistido dele depois da decisão da Urbia. Insistir nesse julgamento é reabrir uma discussão que já foi decidida e que coloca em risco o futuro da Vila de Jericoacoara”, pontua Lucimar.
Para as instituições que atuam em defesa da população local, o julgamento do dia 9 representa uma espécie de última etapa após uma série de decisões que já apontavam para a impossibilidade de cobrança na entrada.
Agora, caberá ao TRF5 decidir se mantém o entendimento já firmado, garantindo livre acesso à vila, ou acolhe o pleito do ICMBio, reabrindo a porta para um “pedágio” de entrada. “A decisão terá impacto direto sobre moradores, trabalhadores, turistas, economia local e sobre a relação institucional entre órgãos federais, a municipalidade e a comunidade tradicional de Jericoacoara”, alerta Lucimar Marques – presidente do Conselho Comunitário da Vila de Jericoacoara.

