A carnaúba e seus desafios: como uma bióloga busca soluções sustentáveis para o sertão.

A carnaúba (Copernicia prunifera) é considerada um dos ícones do sertão cearense, representando uma valiosa fonte de riqueza para os agricultores das regiões mais áridas do Estado. No ano de 2022, o Brasil registrou uma produção de mais de 19 mil toneladas de pó e cera de carnaúba, gerando uma receita próxima a R$ 276 milhões, conforme os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através dos Índices de Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura (PEVS). Essa produção concentra-se principalmente nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte e Bahia, com algumas extrações também ocorrendo no Piauí e no Maranhão.

A agricultura da carnaúba é uma tradição profundamente enraizada nas comunidades locais e frequentemente transmitida de geração em geração. No entanto, essa tradição muitas vezes se traduz em condições de trabalho precárias e práticas insustentáveis. Foi observando esse cenário que a bióloga, Silvania Nogueira decidiu dedicar sua carreira à melhoria das condições de trabalho e ao apoio aos trabalhadores e suas famílias.

Em 2018, após concluir seus estudos nos Estados Unidos, Silvania, com apenas 22 anos, assumiu a liderança do Instituto Carnaúba Socioambiental, uma ONG sediada em Russas e ativa em diversos estados do Nordeste. O principal objetivo da instituição é desenvolver projetos de sustentabilidade ao longo da cadeia produtiva da carnaúba. “Quando cheguei, verifiquei que eles não tinham muito projetos que visassem o desenvolvimento social da cadeia, não tinham evidências de boas práticas no campo e pouquíssimo financiamento”, analisou.

Silvania estabeleceu uma parceria de cooperação técnica com a Trivium Foundation, uma instituição holandesa especializada em projetos sociais em cadeias produtivas ao redor do mundo. Em 2020, essa colaboração resultou na construção de uma escola na Ilha do Goiabal, no município de Araioses, Maranhão, em conjunto com a prefeitura. A escola, que possui uma área total de 655 metros quadrados, oferece uma infraestrutura completa para proporcionar uma educação de qualidade às crianças dos agricultores da região. A escola tem capacidade para acomodar 40 alunos e dispõe de salas de aula e professores em número adequado.

Outro projeto notável foi a consultoria técnica fornecida à União Para Biocomércio Ético (UEBT), uma organização sem fins lucrativos que promove práticas responsáveis na extração de produtos da biodiversidade em várias regiões. Silvania desempenhou um papel crucial no desenvolvimento de um projeto que visava regularizar as máquinas de beneficiamento da palha de carnaúba no Nordeste. Esse projeto recebeu financiamento por meio de uma parceria com a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit GmbH (Agência Alemã de Cooperação Internacional – GIZ), uma empresa alemã especializada em projetos de desenvolvimento sustentável global.

Graças à experiência e compreensão de Silvania da cadeia produtiva, foi possível sistematizar o conhecimento das melhores práticas de saúde e segurança no trabalho, bem como a conformidade com as normas NR 12 e NR 13, que estabelecem padrões para trabalhadores envolvidos na operação de máquinas, caldeiras, vasos de pressão e tanques metálicos. Como consultora, ela desempenhou um papel essencial na adaptação das máquinas, beneficiando toda a cadeia produtiva. Esse esforço resultou na regularização de 20% das máquinas do setor e na redução significativa do risco de acidentes para os 400 trabalhadores que participam anualmente da safra da carnaúba.

No entanto, a agricultura da carnaúba ainda enfrenta inúmeros desafios, especialmente em relação às condições de trabalho muitas vezes desumanas a que os trabalhadores estão sujeitos. Neste momento, a atenção de Silvania está voltada para a mitigação dessas desigualdades sociais persistentes que afetam a vida dos trabalhadores da carnaúba. “É uma questão bastante delicada, mas pretendemos atuar no intuito de diminuir estes índices tão negativos para nosso País”, pontuou.

Sobre Silvania Nogueira

Formada em Ciências Biológicas e Biotecnologia na Universidade Federal do Piauí e pela Assumption University, nos Estados Unidos, Mestre em Biotecnologia também pela Federal do Piauí e doutoranda em Biotecnologia pela Universidade Federal do Delta do Paraíba.