Artesanato | Chapéus mudam vidas na cidade de Varjota

A agricultora Maria de Fátima Sousa, 42 anos, aprendeu cedo a lidar com a palha da carnaúba para fazer chapéu. A técnica foi aprendida com o pai dela, que buscou nesse tipo de atividade algo que ajudasse a ocupar o tempo ocioso e que fosse lucrativo para somar à pequena renda da agricultura familiar de subsistência.
Aos 4 anos de idade, Maria de Fátima foi iniciada numa tarefa comum aos que moram no Semiárido cearense, que é a feitura do tradicional chapéu de palha; aquele utilizado para proteger a cabeça dos nocivos raios do Sol e que, com o tempo, se tornaram acessórios muito procurados, principalmente por turistas que visitam o Estado.
Hoje, morando com dois filhos adolescentes, a agricultora diz que somente anos depois percebeu que aquela atividade tão prazerosa, que rendia algum trocado para a diversão juvenil, tinha um nome e poderia render financeiramente muito mais, até por ser bastante procurada e valorizada. Foi assim que o artesanato entrou de vez na vida dessa moradora de Várzea da Palha, distrito com 120 famílias, localizado a 2 quilômetros da sede de Varjota, no Norte do Ceará.
Renda
“O chapéu me ajuda a pagar minhas contas de água, luz, comprar meu gás e fazer minha feira. Além de ajudar muito nas necessidades de casa, sinto um prazer enorme quando fico sentada em casa, ou na Associação dos Moradores aqui de Várzea da Palha, fazendo meus chapéus para alguma encomenda ou para vender na feira da cidade, no fim de semana”, disse a artesã, que não abandonou a lida no campo, que chega a produzir quatro unidades por dia, do produto mais rústico, sem acabamento, com uma média de R$ 90 de lucro apurado em duas semanas.
Capacitação
É na Associação de Moradores de Várzea da Palha que Maria de Fátima e outras 19 mulheres da comunidade, se reúnem semanalmente para fazer chapéu.
Por enquanto, cada uma cuida de seu investimento, produção e dos lucros com as vendas; mas o grupo já participou de um curso, realizado no início do ano, pela Central de Artesanato do Ceará (Ceart), ligada à Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), que trabalha com grupos produtivos e entidades artesanais, além dos artesãos individuais do Estado. A Ceart realiza capacitações de gestão empreendedora e tecnológica para o desenvolvimento de novos produtos, viabiliza a participação dos artesãos em feiras e eventos, além de dar suporte à qualificação, organização de produção e comercialização do artesanato, com foco na ampliação dos canais de comercialização, em busca de maior renda para o setor.
Durante o curso de uma semana, ministrado por uma estilista e uma chapeleira, as artesãs aprenderam a dar acabamento ao produto, desenvolveram novas técnicas de trançado, e tiveram noções básicas de gestão de negócios.
Produção
“Eu não tinha nenhuma noção de valor, de custo, investimento ou o que cobrar na hora de negociar o chapéu. O curso me ensinou tudo isso. Antes, eu cobrava R$ 0,55 pelo modelo caravana, aquele com as pontas soltas, usado em festas juninas. Com o acabamento e outros trançados, o modelo fica completo, daí eu posso cobrar bem mais pela minha arte, sem ter o atravessador. Hoje, o valor na feira, pode chegar a R$ 20 por unidade”, explica Lusinete Rodrigues, outra habilidosa artesã.
Design
De acordo com a designer de moda, especializada em chapelaria, Jomara Cid, que ministrou o curso para as artesãs de Várzea da Palha, ainda falta a valorização do que é genuinamente cearense, quando se fala em artesanato e moda usando palha. “Falando dos chapéus como adorno, que em sua maioria abastecem as lojas para turistas, observo que a gente não costuma valorizar o que é nosso. Depois desse trabalho que fiz com a comunidade, estou cheia de planos para desenvolver chapéus feitos com a nossa própria palha de carnaúba e lutar para que ela seja mais valorizada aqui”, disse.
“O curso realizado pela Ceart nos chegou por meio de parceria com o Instituto Paulo Freire, que projeta a montagem de uma mini fábrica de chapéus aqui no distrito. Após o curso, aguardamos agora para novembro, o nosso cadastramento para iniciarmos uma produção direta para a Ceart”, comemora Maria Aparecida Xavier Lemos, também ligada à Associação.
Projeto social
A comunidade de Várzea da Palha foi escolhida pelo Projeto Paulo Freire por apresentar, após diagnóstico, alto índice de pobreza. Em 2015, o Governo do Estado, por meio da Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA), realizou uma reunião com prefeitos de 31 municípios cearenses para adesão ao Projeto com investimento até 2019.
Nesse encontro, os representantes do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), investidores financeiros, juntamente com o Estado, esclareceram os critérios de escolha das comunidades beneficiadas com os projetos produtivos e de capacitação de agricultores, com foco especial em jovens e mulheres.
Investimento
O Paulo Freire apresenta investimentos de US$ 80 milhões, sendo metade dos recursos concedidos pelo Fida e a outra metade com recursos oriundos do Estado. Além de Varjota, o Paulo Freire está presente no Norte, nos municípios de Coreaú, Frecheirinha, Graça, Hidrolândia, Ipu, Ipueiras, Irauçuba, Massapê, Moraújo, Mucambo, Pacujá, Pires Ferreira, Reriutaba, Senador Sá e Sobral.
“O projeto social que fez esse levantamento das condições de sobrevivência, juntamente com as famílias daqui, observou o grande potencial que a palha de carnaúba pode ter para a economia, não só dessa comunidade, mas do município de Varjota. Assim como muitos outros, nós também passamos por essa situação de escassez e falta de renda. A chegada de uma pequena fábrica de chapéus poderá dar uma guinada na vida dessas mulheres, que representam a força de sua tradição por meio da sua arte, passada de geração a geração”, destacou a secretária de Agricultura e Agropecuária do Município de Varjota, Rocineuda Ferreira Pires.
Com Informações de Marcelino Júnior