Pai de turista morto em Jericoacoara não acredita que filho comprava drogas e usava símbolo de facção: ‘Querem inverter a situação’

Henrique Marques de Jesus, de 16 anos, foi encontrado morto na cidade cearense em dezembro. O pai, Danilo Martins de Jesus, afirmou que a polícia nunca o manteve informado sobre os detalhes da investigação e revelou que o filho vestia uma roupa azul, não uma com símbolo de facção.

O pai de Henrique Marques de Jesus, adolescente de 16 anos que foi sequestrado e morto por criminosos na Vila de Jericoacoara, no litoral do Ceará, não acredita que o filho tenha sido assassinado após tentar comprar drogas, nem que usava uma camisa estampada com o yin yang, símbolo milenar chinês, que, segundo a polícia, também seria usado pelo PCC.

“O que eles [policiais] querem fazer é, como fazem sempre, inverter a situação para o lugar [Jericoacoara] não perder os turistas“, disse Danilo Martins de Jesus, que é morador de Bertioga (SP).

Henrique foi encontrado morto após desaparecer na Vila de Jericoacoara em 17 de dezembro de 2024. A morte foi confirmada pelo pai no dia seguinte. O corpo estava perto da Lagoa Negra, um local afastado do centro da vila e que costuma ficar deserto à noite.

Conforme relatado por uma fonte policial, o jovem usava a roupa com o símbolo yin yang quando tentava comprar drogas em uma “boca” dominada pelo Comando Vermelho, grupo rival do PCC. O pai de Henrique, no entanto, não acredita nessa linha de investigação e a considera mentirosa.

Danilo, que tem 33 anos e trabalha como empreiteiro no litoral de São Paulo, disse ter recebido todas as informações sobre o caso por meio da imprensa, “desde quando acharam o corpo até hoje”.

Segundo ele, a falta de contato por parte da polícia o afastou da investigação da polícia cearense. “Se dependesse deles, eu não sabia de nada até agora”, se queixou o pai.

Cadê a camiseta?

Danilo contou ao g1 que Henrique vestia uma camiseta diferente da citada pelos policiais no dia em que foi morto. Ele inclusive questionou como os agentes sabiam que o jovem usava uma roupa com o símbolo yin yang, se ela não foi encontrada.

“[A camiseta que ele usava] Era a azul escura, da marca Adidas, a mesma que o adolescente vestia na foto em que aparece fazendo o símbolo “tudo três”, lembrou o pai do garoto.

O g1 entrou em contato com a Polícia Civil do Ceará para informações atualizadas sobre o caso, mas não obteve retorno até a última atualização da reportagem.

‘Podem falar o que quiserem’

 

Turista desaparecido em Jericoacoara é visto por imagem de câmera sendo imobilizado por vários homens — Foto: Reprodução

Turista desaparecido em Jericoacoara é visto por imagem de câmera sendo imobilizado por vários homens — Foto: Reprodução

O empreiteiro ressaltou que Henrique era um bom garoto e que, agora, nada que ele faça vai reverter o assassinato do filho.

“Já aconteceu, eles [policiais] podem falar o que quiserem. […] não vai adiantar de nada. Então, eu não estou fazendo questão [de saber nada] porque eu sei que a Justiça é muito fraca aqui no Brasil”, lamentou.

E os gestos?

 

Danilo lamentou o fato de que muitos símbolos foram apropriados por facções. Inicialmente, a informação divulgada era de que Henrique teria sido morto após ser confundido com um membro de uma facção rival dos criminosos que o sequestraram, devido a gestos com as mãos.

“A gente não pode fazer mais nada que é envolvido com facção? Eu estou trabalhando aqui, embaixo do sol quente. Se eu tirar uma foto e fizer um símbolo, quer dizer que sou envolvido com alguma coisa?”, questionou Danilo. “Isso aí é um pretexto que eles colocam”, disse.

Luto persiste

Três suspeitos de envolvimento na morte do turista foram capturados. Segundo a Polícia Civil, entre eles, estão dois adolescentes e um homem de 36 anos, apontado como chefe de um grupo criminoso de Jericoacoara e mandante do crime que vitimou Henrique. O homem já estava preso quando foi cumprido o mandado contra ele.

Mesmo com as recentes capturas, Danilo revelou ao g1 estar sentindo o mesmo de quando o filho foi morto.

A mesma dor, a mesma falta, a mesma coisa. Vai ser preso [o criminoso], mas sai, né? O meu filho que está preso, não sai mais nunca“, afirmou.

Investigação

Inicialmente, a polícia havia divulgado que Henrique havia sido assassinado por posar para fotos fazendo o símbolo “tudo três”, que, na linguagem de facções, remete ao PCC. Conforme o pai de Henrique, ele não sabia do significado do gesto.

Ainda conforme relatado por uma fonte policial ao g1, conforme novos indícios apurados pela Polícia Civil, o adolescente teria ido ao encontro dos criminosos para comprar drogas, porém, o desenho na camisa que ele usava chamou a atenção dos assassinos, o que resultou no sequestro seguido de morte.

Com essa nova descoberta, a hipótese de que o crime foi motivado por conta dos gestos com as mãos feitos por Henrique em fotos começou a perder força.

Símbolo apropriado por facção

Segundo a fonte, a camisa que Henrique usava no momento que foi sequestrado tinha a figura de uma meia lua yin-yang, que no taoismo chinês representa a dualidade e a complementaridade dos opostos, mas no mundo do crime faz alusão ao Primeiro Comando da Capital (PCC).

A camisa do adolescente com a imagem não foi encontrada pela polícia. Nas imagens das câmeras que mostram Henrique sendo levado à força por vários homens, ele já aparece sem blusa.

Além da meia-lua, o PCC tem como simbologia o número “três”, costumeiramente feito pelo turista nas fotos. Apesar da coincidência, o pai do jovem já havia relatado ao g1 que o filho desconhecia que o significado desse gesto era ligado a facção criminosa.

Os suspeitos de matar Henrique são membros do Comando Vermelho, rival do PCC, que tem como símbolo o número dois, além do desenho de uma foice com martelo, imagem ligada ao surgimento da facção.

Fonte: G1 Ceará