STF suspende foro privilegiado para defensores públicos do Ceará

Em decisão liminar, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu o foro privilegiado para defensores públicos do Estado. A medida foi assinada pela ministra Cármen Lúcia, atendendendo a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, que aponta como inconstitucional norma da Constituição do Ceará, que estabelece “foro por prerrogativa de função” a membros da Defensoria Pública do Estado do Ceará. Desde a aprovação da Emenda Constitucional 80, em 2014, os defensores gozavam da prerrogativa de julgamento pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-CE) como primeira instância.

A decisão, que ainda será analisada pelos demais ministros em plenário, determina, até que o tema seja julgado, a “suspensão cautelar” do trecho que lista os membros da Defensoria entre os detentores do foro privilegiado. É o artigo 108, inciso VII, que atribui ao Tribunal de Justiça a competência de processar e julgar, originariamente:

a) Nos crimes comuns e de responsabilidade, o Vice-Governador, os Deputados Estaduais, os Juízes Estaduais, os membros do Ministério Público, os membros da Defensoria Pública, os Prefeitos, o Comandante Geral da Polícia Militar e o Comandante Geral do Corpo de Bombeiros Militar, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

Quem tem foro especial  

Na ADI, Aras argumenta que a Constituição estabelece o foro por prerrogativa de função para presidente e o vice-presidente da República, deputados federais e senadores, ministros do STF, dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU), procurador-geral da República, ministros de Estado, advogado-geral da União, comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, chefes de missão diplomática de caráter permanente, governadores, magistrados, conselheiros dos Tribunais de Contas, membros do Ministério Público e prefeitos.

Pelo princípio da simetria, essas autoridades são a referência para que as constituições estaduais indiquem os seus equivalentes. Como os membros da Defensoria Pública da União não têm o foro especial, não cabe, conforme o PGR, o mesmo aos defensores públicos no Estado.

Na decisão, que data do último dia 15 e foi publicada na edição desta terça-feira (19) do Diário de Justiça Eletrônico (DJE), a ministra Cármen Lúcia destaca trecho da ADI que diz que “a autonomia organizativa dos Estados-membros, tal como advinda do pacto federativo, não traduz um salvo-conduto para que estabeleçam nas cartas estaduais o que lhes aprouver”, e ainda outro que considera que “o entendimento pelo qual o foro por prerrogativa de função não é extensível a Defensores Públicos já está pacificado pelo Supremo Tribunal Federal. Trata-se de precedente formado pelo Plenário na ADI 2553/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. em 15/5/2019”

A decisão requisita, ainda, “com urgência e prioridade”, informações ao governador e ao presidente da Assembleia Legislativa do Estado (AL-CE), em um prazo de 10 dias. A Defensoria Pública do Estado, a Associação dos Defensores Públicos do Ceará (Adpec), o governador Camilo Santana e o presidente em exercício da AL-CE, deputado Fernando Santana (PT), foram procurados pela reportagem, por meio de suas assessorias, mas ainda não se pronunciaram sobre o assunto.

Quando do ajuizamento da ADI, em agosto, a Defensoria Pública do Ceará se manifestou, em nota, argumentando que os estados têm autonomia para, por meio da Assembleia Legislativa, conceder foro por prerrogativa de função aos defensores públicos. Declarou ainda que o foro “não se constitui como benesse, mas como forma de proteção do cargo de um agente político que se transformou nas últimas décadas, exercendo função de defesa de direitos das mais variadas concepções”.

O que é o foro privilegiado  

O foro especial por prerrogativa de função, conhecido por muitos como foro privilegiado, é um mecanismo legal que dá a seus beneficiados a prerrogativa de ser julgado por tribunais superiores em casos de ações penais.

Estados não podem inovar em Direito processual  

Além da ADI questionando o dispositivo na constituição cearense, Aras também protocolou outras 16 ações do mesmo tipo no STF, todas questionando a atribuição do foro privilegiado a autoridades que não são listadas na Constituição Federal, como delegados, procuradores, auditores militares, presidentes de entidades estaduais e reitores, além de defensores públicos.

Segundo o procurador-geral, os estados não podem inovar nessa área, pois a União tem a competência exclusiva para legislar sobre Direito Processual. A seu ver, as constituições estaduais, ao prever o foro por prerrogativa de função a ocupantes de cargos que não constam da Constituição Federal, violam o princípio da isonomia, pois atribuem tratamento desigual, pois todos os servidores públicos, quando não qualificados como agentes políticos, são processados e julgados no primeiro grau de jurisdição.

Associação

À reportagem, a Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep) e a Associação dos Defensores Públicos do Estado do Ceará (Adpec) disseram ter tomado conhecimento “há pouco” da decisão da ministra da STF. “A prerrogativa de foro em razão da função é uma necessidade decorrente da paridade de armas, para o bom desempenho das funções defensoriais. Serão analisados próximos passos a serem adotados”, explica Regis Gonçalves, que é diretor jurídico da Adpec. As entidades entraram com Amicus Curiae, mas ainda não houve decisão sobre a ação.

Outras ADIs  

As ações ajuizadas pelo procurador-geral questionando a constitucionalidade do foro especial são as seguintes: ADIs 6501 (Pará), 6502 (Pernambuco); 6504 (Piauí); 6505 (Rio de Janeiro); 6506 (Mato Grosso); 6507 (Mato Grosso do Sul); 6508 (Rondônia); 6509 (Maranhão); 6510 (Minas Gerais); 6511 (Roraima); 6512 (Goiás); 6513 (Bahia); 6514 (Ceará); 6515 (Amazonas); 6516 (Alagoas); 6517 (São Paulo); e 6518 (Acre).

Fonte: Diário do Nordeste

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